Quando somos crianças temos diversos medos. Tenho na minha escassa memória de infância que fui uma garota medrosa. Confesso que tenho algumas frustrações por conta desses medos: apesar de morrer de vontade de andar de patins nunca andei porque tinha medo de cair, cheguei até a colocá-los nos pés e ensaiar me levantar, mas não passou disso. Eu tinha medo de borboletas, de que elas pousassem na minha cabeça ou no meu rosto.
Na realidade, ainda hoje, adulta, tenho medo de pequenos bichos voadores, os chamados louva-a-deus, as cigarras, baratas, aranhas, libélulas etc., com exceção das borboletas, que de uma forma inconsciente aprendi a adorá-las pelas cores maravilhosas que elas têm, pela efemeridade de sua existência e pela liberdade de voar por onde quiser, adoro-as tanto que tatuei uma azul no punho do meu braço direito.
Tenho também medo de ficar sozinha na velhice, morro de medo de que meus dentes estraguem, tenho medo de perder o controle dos meus atos – enlouquecer –…
Anos atrás, li na porta do centro acadêmico de Letras – CALET, da UFMT, do qual eu fazia parte, um trecho de ‘O livro dos abraços”, de Eduardo Galeano:
“O medo
Certa manhã, ganhamos de presente um coelhinho das Índias. Chegou em casa numa gaiola. Ao meio-dia, abri a porta da gaiola. Voltei para casa ao anoitecer e o encontrei tal e qual o havia deixado: gaiola adentro, grudado nas barras, tremendo por causa do susto da liberdade.”
Gostei muito do escrito, apesar de ter ficado com muito dó do coelhinho… Esse texto ficou na minha mente durante anos, levando-me a pensar quão grave evento pode mexer com a nossa cabeça e deixar marcas indeléveis, às vezes boas, outras ruins, no caso do bichinho, ruins.
Tempos atrás passei por situação similar à do animalzinho, com uma diferença: eu não estava em grades, pelo menos não físicas, apesar de me sentir em uma cela estava presa em mim mesma, nas escolhas erradas que havia feito e no medo do que tudo isso representava para mim no momento.
Adiei por anos a tomada de uma decisão, que pela demora não podia deixar de ser drástica, mas tive certa coragem e, claro, oportunidade, e com a ajuda, sempre em primeiro lugar, de Deus, da família e amigos, consegui, a duras penas, minha libertação, consegui, enfim, sair da prisão que me meti e então tive aquela sensação boa e ao mesmo tempo incômoda, talvez como a que o coelhinho vivenciou, porque nessa ocasião vem a pergunta: o que fazer agora?
O animalzinho estava tão acostumado à prisão, submisso e à mercê de quem o alimentasse que a liberdade jamais vivenciada o assustava e o aprisionava. No meu caso, me senti livre, mas também estava tão acostumada àquela sensação de prisão que não acreditava que podia respirar, viver as coisas simples e normais da vida como poder almoçar em paz sem olhar para o relógio, ou melhor, nem usar relógio, desligar o celular para fazer uma sessão de uma hora de acupuntura e shiatsu sem me preocupar com alguma ligação ‘importante’…
Com todas essas sensações à flor da pele posso dizer que estou sim meio perdida, meio sem rumo, me perguntando o que fazer agora? Na verdade, eu sei a resposta, mas não quero encará-la, não ainda, não hoje. Sei que o tempo está diminuto, pois já não tenho 20 anos e percebo que com o passar dos anos essas crises de identidade vão se perdendo no meio do turbilhão de responsabilidades que a vida adulta nos cobra.
Mas por outro lado, prefiro acreditar que tenho uma janela de oportunidades aberta para mim e não posso fechar os olhos para nenhuma delas, pois as oportunidades da janela também vão diminuindo ao longo dos anos.
Bem, o que sei mesmo é que com essas novas experiências, decidi seguir o conselho de uma das grandes lições de Jesus: “Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais vos será acrescentado. Não vos inquieteis, pois, com o dia de amanhã, porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.”
Estou aprendendo, com algumas recaídas, vez ou outra, a viver um dia de cada vez, e isso pra quem me conhece sabe que é um grande passo, pois ansiedade é meu nome e agora é meu sobrenome…

Adorei