Como todos sabem ou saberão agora, sou revisora de textos. Formei-me em Letras pela UFMT.
Desde os primeiros semestres da faculdade tinha certeza de que queria ser revisora, mesmo sabendo que o meu curso era voltado para a licenciatura. E como o curso não disponibilizava meios para eu me profissionalizar como revisora parti para o plano B, procurei adquirir experiência trabalhando, revisando trabalhos de colegas da faculdade, livros, e depois de certo tempo fiz um estágio na editora da UFMT, tudo de graça, porque segundo meu primo Arthur, professor de inglês, todo trabalho é bem-vindo para adquirir experiência, mesmo que de graça.
Claro que boas gramáticas e bons dicionários estiveram comigo por todos os anos e ainda continuam. Adoro-os todos, tenho inúmeros dicionários e inúmeras gramáticas, as tradicionais, as que se dizem modernas, mas que não passam de tradicionais mascaradas, enfim… para todos os gostos.
Bem, mas o que me proponho a escrever aqui hoje é que passei por um dilema, uma crise existencial-profissional.
Comprei um livro para ler nas férias, que eu adiei durante muitos anos a leitura, apesar de ter sido indicado por alguns professores: ‘Preconceito linguístico – o que é, como se faz’, de Marcos Bagno. O autor enfoca que o preconceito linguístico está ligado à confusão criada em relação à língua – que aprendemos e temos contato desde os primeiros anos de vida – e gramática normativa… a verdade é essa, todo o mundo tem pavor de português porque o confunde com a gramática. O autor enumera oito mitos do preconceito linguístico e depois sugere resoluções para quebrar esses paradigmas.
Esse livro quebrou todos os preconceitos, todos os paradigmas e o pior de tudo, ele quebrou todos os ‘meus’ conceitos, todas as ‘minhas’ convicções em relação à língua portuguesa.
O assunto é muito polêmico, eu sei, e diria também infindável, por isso vou abordar o que diz respeito apenas a mim, as minhas crenças e descrenças. De cara fiquei muito confusa. Pensei com meus botões, depois de ler esse livro como vou encarar o meu trabalho, diga-se de passagem, temido por inúmeros autores, que é o de “corrigir” os “erros de português” deles, afinal, tudo não passa de variação linguística?
Bem, a verdade é que adoro a língua portuguesa como a conheci, brasileira, apesar da origem neolatina e portuguesa e durante muito tempo fui radical no sentido de o que é ‘certo ou errado’ na língua, acho que natural para quem estava se formando em letras, eu disse acho!
O tempo foi passando e pimba, esse livro ‘caiu’ em minhas mãos em uma fase de maturidade, de forte compreensão em relação à vida etc.
Na verdade, depois de lê-lo, fiquei um tanto aliviada, pois o que aprendi com o livro é que não vamos aqui ter de nos esquecer de tudo o que aprendemos, apenas vamos, como sugere o autor, usar a língua, tanto na modalidade oral como na escrita, e tentar encontrar o ponto de equilíbrio entre dois eixos: o da adequabilidade e o da aceitabilidade. O que isso quer dizer? Que se eu estiver conversando com uma pessoa menos instruída, não vou ficar exibindo meu repertório lexical, como dizia meu professor de Latim, não vou dizer ao indivíduo, ‘por obséquio, qual a sua graça?…’ E se eu estiver palestrando para alunos de pós-doutorado em filologia, não vou dizer, ‘Qualé, mermão?’ ‘Tá ligado?!’, a não ser que eu esteja dando algum exemplo de dialeto ou coisa do gênero.
Como disse, o assunto é polêmico e infindável, mas fica aqui a ideia para reflexões e futuras indagações.